terça-feira, 27 de maio de 2008

O amigo do meu amigo é meu inimigo (?)

Me surpreendi quando entrei, por estes dias, no blog do Fernando Trevisan. E foi uma boa surpresa. Ainda sobre resenhas negativas! e texto anterior Sobre resenhas negativas. Os textos falam sobre como os autores recebem críticas dirigidas a seu trabalho.

O assunto é recorrente desde o início nas reuniões do nosso grupo - antes de qualquer texto entrar para o fanzine, ou assim que ele termina de ser produzido, uma saraivada de críticas é disparada de todos os lados pelos outros membros do grupo, sem piedade. Nem tudo é aproveitado pelo autor (é claro, graças a deus). Me senti um pouco identificado com a postura expressa pelo Fernando. Um pouco.

A postagem dele sobre o assunto me lembrou um artigo do Marcelo Simão Branco que eu havia lido, há algum tempo. Ele fala sobre o que está convencionado chamar por aí de "fandom", mais especificamente, ao que parece pelo contexto do artigo, de um grupo específico inserido nesse cenário:

"(...) O problema é que esta comunidade, a título de se defender do mundo externo, digamos assim, meio que se enquadrou numa espécie de guetto, por vezes com atitudes pouco profissionais, nos quais a atividade da crítica, por exemplo, tem sido severamente desestimulada, quase como se fosse um ambiente de patota, dos amigos que escrevem e não podem ser francos uns com os outros para não ferir suscetibilidades. Outro problema, decorrente em parte deste é a falta de pressão para se escrever melhor, porque não existe um cenário profissional que estimule a competição entre os autores por textos e histórias de melhor qualidade. Ou seja, é uma comunidade que passou a gradativamente desestimular um desenvolvimento artístico mais maduro e profissional."

- Marcelo Simão Branco, no artigo Por que a Ficção Científica Brasileira é invisível e marginalizada?

Não tem desculpa. Sem crítica não há desenvolvimento do trabalho - de qualquer trabalho. O sujeito que não quer ouvir crítica, que só quer regozijo, não quer mudar o que escreve, talvez não esteja nem muito interessado no que escreve afinal.

E com a não-crítica institucionalizada fica difícil colaborar para um cenário com melhor qualidade (seja de produção, seja de compreensão e discussão acerca dos temas e objetos literários). Uma profusão de textos resenhísticos, muitas vezes releases de textos de orelha que não fazem mais do que uma propaganda de comercial nivelam por baixo o circuito da literatura fantástica e congêneros. Para quem produz resenhas ou textos reflexivos sobre a produção desses grupos é um alívio ver-se em um contexto no qual os autores não o odiarão por ser sincero.

E o sistema, se continuar institucionalizado assim, não poupará ninguém. Se ele perdurar, restará ignorar o que não consideramos e super-valorizar (para equilibrar a balança) aquilo que nos é de apreço.

Por aí parece que é diferente, mas para mim é frustrante. Quanto as pessoas dizem "é, está bem escrito" ou o maldito "gostei, legal" e variantes, não adianta nada, isso é ponto comum. Certa vez ouvi um escritor dizer que ficou emocionado, realizado, quando viu o primeiro perfil fake de Orkut com o nome de um personagem do livro dele. Não sei o que passa pela cabeça desse escritor, mas eu não consigo ver nada de bom nisso.

Um comentário:

Fernando S. Trevisan disse...

Meu rss feed que pirou e só recebeu este post agora ou a data que saiu errada, mesmo? :)

Mas, pessoal, agradeço a citação e a continuidade da reflexão/discussão. Acho que quanto mais o meio de literatura fantástica (não só literatura, claro, cinema, teatro, etc.) estiver amadurecido, menos teremos que nos preocupar com as questões de "gueto" e de críticas mal-recebidas.

Publiquei recentemente - refletindo textos do Fábio Fernandes e do Jacques Barcia - minhas "regras pessoais" para escrever resenhas:

http://fernandostrevisan.com.br/leituras/2008/08/regras-para-as-resenhas.cfm

Que, acho, cabem/entram na mesma discussão acima.

Abraço a todos do Fabulário!